Foi ontem que eu te vi pela primeira vez

Foi ontem que eu te Vi pela primeira vez. Vi-te, não com os olhos, mas com a alma. Ontem apercebi-me que eras mais do que aquele simples rapaz acanhado, de face pálida e olhar sedutor. Reparei em ti.
Para mim, deixaste de ser tudo o que ouço dizer de ti, tudo o que via ao olhar o teu corpo desajeitado, mas belo. Descobri que palavras não são mais do que armas cruéis, que distorcem os nossos sentimentos. Esta é a verdade.
Nas palavras procuramos consolo, que nunca encontramos. Apenas quando te olhei nos olhos, vi que esgotaria todas as palavras do mundo antes de os conseguir descrever. E aí comecei a colocar-te sobre um pedestal, tão alto que era impossível tocar nos teus pés. E arrependi-me.
No outro dia, estava tão trémula, ao falar contigo naquele corredor de alcatrão sujo. E nem cheguei a saber se te apercebeste do meu nervosismo. Bem que tentei evitar o bater tão desesperado do meu coração, mas a minha voz saia distorcida, e ainda hoje não me recordo de uma palavra do que disse, ou que tu disseste. Apenas recordo o momento em que, na tua voz melodiosa, me ofereceste um olá distante, mas mesmo assim agradável. Era bom ouvir a tua voz passado tanto tempo. Já me tinha esquecido de quase tudo do passado, menos de ti. Acho que tinha saudades, só tuas, de mais ninguém. Porque só tu é que fazes o meu coração despertar do silêncio em que vive, da solidão em que se desvanece.
Um dia talvez me digas que conseguiste ver em mim um décimo do que vi em ti, mas nem tu saberás o quanto eu vi, quando o meu olhar suplicante aterrou junto ao teu, mais infinito do que o céu e o mar.
Sei que não gostas de mim. Desculpa por ser tão desajeitada, tão inferior. Talvez um dia me perdoes a ousadia de te amar assim.

Hoje, só quero a frescura dos teus olhos. Nada mais.